Conceição Evaristo, nascida em Belo Horizonte, é hoje uma das mais importantes representantes da literatura afro-brasileira no país. Seu livro mais conhecido, Ponciá Vicêncio, narra as desventuras de uma mulher negra na cidade grande. Como as figuras de barro que constrói, Ponciá é fragil e delicada, mas sua sensibilidade artística não a livra de todas as formas de violência que historicamente atingem às mulheres negras e pobres. Porém, Ponciá é também forte como a arte e seu desejo de liberdade se revela em suas memórias, na luta para reencontrar seu passado negado, sua família, sua identidade.
Vozes-mulheres
Conceição Evaristo
A voz de minha bisavó ecoou
A voz de minha avó
ecoou obediência
aos brancos donos de tudo.
ecoou obediência
aos brancos donos de tudo.
A voz de minha mãe
ecoou baixinho revolta
no fundo das cozinhas alheias
debaixo das trouxas
roupagens sujas dos brancos
pelo caminho empoeirado
rumo à favela.
ecoou baixinho revolta
no fundo das cozinhas alheias
debaixo das trouxas
roupagens sujas dos brancos
pelo caminho empoeirado
rumo à favela.
A minha voz ainda
ecoa versos perplexos
com rimas de sangue
ecoa versos perplexos
com rimas de sangue
e fome.
A voz de minha filha
recolhe todas as nossas vozes
recolhe em si
as vozes mudas caladas
engasgadas nas gargantas.
recolhe todas as nossas vozes
recolhe em si
as vozes mudas caladas
engasgadas nas gargantas.
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